Comunidades de ex-seringueiros esquecidos à beira do Rio Gregório, têm novas perspectivas de acesso à políticas públicas com a criação da mais recente reserva do Amazonas.
Fotos e texto por Luiz Maudonnet
A Reserva Extrativista (RESEX) do Rio Gregório é uma das mais recentes reservas criadas no estado do Amazonas. Caracterizada por ser uma das áreas de maior riqueza de biodiversidade da Amazônia, a região ainda apresenta marcas do coronelismo praticado no isolado Rio Gregório, como consequência da antiga economia da borracha, responsável pelo processo de colonização da área.
O povoamento não indígena da região teve inicio no final do século 19, com o primeiro ciclo da borracha no Amazonas, e em seguida, durante a Segunda Guerra Mundial, em um período que ficou conhecido como a Guerra da Borracha. Para suprir a crescente demanda das forças aliadas por borracha, mais de cem mil trabalhadores rurais (em sua maioria, nordestinos), os “soldados da borracha”, foram enviados para as redondezas do Rio Gregório, para trabalhar com o mercado lucrativo da seringa, sob falsas promessas de distribuição de títulos de terra, oportunidades financeiras e um retorno para suas terras natais como heróis nacionais.
Os títulos e o heroísmo nunca vieram. Daqueles cem mil que sonhavam com o retorno para casa, pouquíssimos realmente o conseguiram. Os que não morreram pelas doenças ou pelos perigos da floresta, viram-se imersos em um sistema de trabalho semi-escravo.
Com a nova desvalorização da borracha, os coronéis, lentamente, foram desaparecendo, e os seringueiros permaneceram espalhados pelo Rio Gregório.
Sr. Raimundo Euler, morador da reserva e ex-seringueiro, conta a história do avô, iniciada no último ciclo da borracha da Amazônia. Ele relata que sua família veio do Nordeste em busca de uma vida melhor, e acabaram como seringueiros. Era um trabalho duro e, durante muito tempo, tiraram muita borracha dessas matas. O “Regatão”, tipo de barco a serviço do coronel, vinha e levava toda a borracha em troca dos mantimentos. Só sobrava um pouco de comida e a fumaça da borracha.
Até poucos anos, as comunidades que compõem a RESEX do Rio Gregório viviam em um limbo. As grandes distâncias dos municípios mais próximos, 350km de Eirunepé (Amazonas) e 250km de Cruzeiro do Sul (Acre), somadas à dificuldade de acesso à área, faziam com que os moradores da tivessem raríssimo acesso a políticas públicas.
Sem o apoio do poder público, a região experimentou sucessivos modelos de exploração desordenada de recursos naturais, como a caça, a pesca e a exploração de madeiras nobres. Tal fato agravou a já precária situação social dos moradores do Rio Gregório.
Em 2009, foi criada a reserva. Isso incentivou os moradores a se organizarem em comunidades, saindo do sistema de distribuição imposto nos tempos da seringa. Depois de muito tempo de instabilidade econômica, a criação da reserva foi decisiva para a inclusão dos ribeirinhos em um processo mais justo de geração de renda. Pela primeira vez, a reserva está permitindo o acesso à cidadania para um grupo de pessoas que, até então, vivia esquecido à beira do Rio Gregório.
Os objetivos da reserva priorizam os benefícios econômico-sociais, além da participação nas definições de políticas públicas. Hoje, membros do Executivo e do Legislativo dos Municípios da região buscam maior envolvimento com a associação de moradores e lideranças comunitárias do Rio Gregório. Agora, eles existem.
Ao longo do processo de implementação da reserva, sugiram parcerias que trouxeram melhorias significativas à educação da população da região. Este é o segundo ano com mais de 100 dias de aulas no ano. Após a implementação da reserva, o número de escolas cresceu de 3 para 16.
Foram muitas gerações perdidas, sem acesso aos estudos ou outras possibilidades que não fosse o trabalho pesado. A criação da reserva foi o primeiro passo para permitir que, pela primeira vez, uma geração de crianças e adolescentes não tivessem como única opção um cabo de enxada ou faca de seringa.
Estas fotos retratam os dias de encontro de todas as comunidades da RESEX do Rio Gregório para elegerem o novo presidente da associação de moradores, a AMARGE. Os comunitários comemoraram com jogos, apresentações de teatro e com fogos de artifício a possibilidade de escolher quem irá cuidar dos ex-seringueiros da região, direito adquirido recentemente, após décadas de escassez em uma floresta, paradoxalmente, abundante.
Atualmente, o fotógrafo Luiz Maudonnet está realizando um campanha para levantar recursos para a Associação de Moradores do Rio Gregório, (CNPJ 10.982.260/0001-63) através da venda de seu trabalho. Parte do valor será revertido para a Associação para a compra de materiais escolares, maquinário e investimentos em empreendimentos locais.
Interessados em contribuir, podem entrar em contato pelo email contato@luizmaudonnet.com, com o título CAMPANHA RIO GREGÓRIO.
Para saber mais sobre o trabalho de Luiz Maudonnet:
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