O fotógrafo Hudson Rodrigues faz um recorte sobre os temores e anseios de adolescentes do ensino público na periferia de São Paulo
Fotos: Hudson Rodrigues
Texto: Everyday Brasil e Matheus Lima
Em 2019, o fotógrafo Hudson Rodrigues voltou ao bairro de Americanópolis, na zona sul de São Paulo, onde morou por muitos anos, a fim de rever sua adolescência pelos olhos dos jovens que ali vivem atualmente.
Sua experiência como adolescente, com medos, sonhos e as tentativas de escapar do que não era bom nesse contexto, o impulsionou a retornar e pensar sobre esse período da vida a partir do ponto de vista desses jovens. "Quis traçar um paralelo entre os meus sonhos de garoto com os sonhos atuais desses adolescentes, a maioria deles são de famílias simples, com dificuldades financeiras e sociais", conta Hudson.
Para o fotógrafo, umas das coisas que mais o marcaram na época em que viveu no bairro foram as escolas públicas locais, com estrutura precária e sem muitos recursos. Hudson escolheu uma das escolas, estabeleceu uma relação com alguns alunos e deu a eles um papel onde pediu para que escrevessem sobre seus medos e sonhos.
O resultado é um trabalho tão potente quanto delicado, que nos leva a refletir sobre os nossos próprios anseios e angústias diante de um Brasil que desmorona a cada dia nas mãos de um governo explicitamente desinteressado pelo ser humano e sua evolução.
Na opinião de Hudson, mesmo depois de tantos anos distante do bairro e da escola, as aspirações e receios dos adolescentes não mudaram muito naquela região, continuam esperando por dignidade e condições de sonhar, e o maior sonho é não ter mais medo.
O SONHO DA EDUCAÇÃO BÁSICA PÚBLICA NO BRASIL
por Matheus Lima
A escola pública é uma instituição fundamental e sua situação é uma boa imagem do que é a sociedade na qual ela está inserida. Em outras palavras, o projeto de sociedade é, em grande medida, o projeto de escola pública.
Se, por um lado, as lutas populares, ao longo da história, alcançaram conquistas como a educação pública universal e gratuita - sem esquecer que, até pouco tempo atrás, não havia vagas para todas as crianças - por outro lado, esses avanços foram sempre combatidos e condicionados por interesses contrários, dos setores que se beneficiam das desigualdades em suas múltiplas formas.
A estrutura precária da escola que o fotógrafo Hudson Rodrigues visitou para o ensaio fotográfico é o retrato disso. Para os pobres, uma escola pobre.
O tempo em que vivemos, de obscurantismo político no Palácio em Brasília, a pandemia e o agravamento da crise econômica aprofundam a precarização da educação e aumentam as desigualdades. É o projeto de ruína de uma construção que nunca se concluiu.
Se é verdade que é preciso mudar a sociedade para que haja mudança na educação, é também verdadeiro que os principais agentes de transformação que virão são as meninas e meninos que estão na escola pública, que, apesar de tudo, resiste.
Não há saída para o buraco em que fomos metidos sem que haja conexão com o enfrentamento dos medos e a busca de realização dos sonhos dessa meninada. Que encontremos esse caminho.
Matheus Lima é professor de história na rede pública estadual de São Paulo.
Para saber mais sobre o trabalho de Hudson Rodrigues:
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